domingo, 14 de outubro de 2012

Além da fronteira do Cosmos.

O físico e astrônomo Marcelo Gleiser escreveu o texto reproduzido abaixo, muito interessante para observarmos a lenta mas segura evolução da ciência em busca de uma melhor compreensão do universo, sua origem e destino.
Mundos paralelos, multiversos, teoria das cordas...cada vez mais as perguntas clássicas sobre o que havia "antes" do big bang ou como algo poderia existir "para sempre" ou ser "infinito" são substituidas por novas formulações, enfoques e hipóteses.
As quatro dimensões conhecidas hoje podem ser onze, sendo dez espaciais e mais o tempo, mas idéias assim são tão difíceis de serem compreendidas que ainda soam como ficção científica, pelo menos para nós seres humanos normais.
Mas não são... são degraus, etapas, passos,é  importante lembrar que ao contrário do que apregoam alguns teistas fanatizados a resposta "não sei" da ciência para algumas perguntas não é demérito, é desafio.

Segue o texto de Gleiser, publicado na Folha.

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Onde termina o Universo? A resposta depende de muitos fatores. Quando os cosmólogos afirmam que o Universo está em expansão, as pessoas imaginam uma espécie de explosão a partir de um ponto central, feito uma bomba. As galáxias que se afastam são como os detritos da bomba, voando pelo espaço.
Embora seja intuitiva, essa imagem está errada. A expansão do Universo é uma expansão do próprio espaço, o qual, após a teoria da relatividade geral de Einstein, ganhou plasticidade: ele pode se expandir, contrair-se ou se dobrar como um balão de borracha.
As galáxias -que, feito ilhas num oceano, são os marcos cósmicos de distância- são carregadas pela expansão do espaço. Se elas têm um movimento adicional, por exemplo, quando duas próximas se atraem gravitacionalmente, ele é superposto ao seu afastamento inexorável, causado pela expansão do espaço. Uma das consequências imediatas dessa expansão é que o Universo não tem um centro.
Imagine que você, da sua galáxia, observa outras à sua volta. Com a expansão do espaço, todas estão se afastando. A conclusão seria que a sua galáxia deve ser o centro de tudo -mas não é. Um observador numa outra galáxia vê todas as galáxias, inclusive a nossa, afastando-se dele. O mesmo com todas as galáxias. No Universo, todos os pontos são igualmente importantes.
Mas, se isso é verdade, como explicar a contração do espaço perto do Big Bang? Se o Universo agora está em expansão, no passado as distâncias eram menores. Astrônomos podem medir as velocidades de afastamento das galáxias e, passando o filme ao contrário, projetar quando elas estariam amontoadas em um volume mínimo.
Esse momento marca o início da nossa história cósmica, quando tudo começou -cerca de 13,7 bilhões de anos atrás, aproximadamente o triplo da idade da Terra.
Quando juntamos a história cósmica com a velocidade da luz, chegamos ao conceito de horizonte cósmico. Como a velocidade da luz define a da informação que recebemos, num Universo com idade finita só podemos receber informação de objetos situados até a distância que a luz percorreu nesse tempo. Feito a linha do horizonte, que marca quão longe enxergamos da praia.
Mas o mar não termina no horizonte. E o Universo? Também não. Se o Universo não estivesse em expansão, a distância até o horizonte seria de 13,7 bilhões de anos-luz. Como o espaço estica com o tempo, ondas de luz pegam uma carona e podemos ver mais longe: o horizonte cósmico fica a cerca de 46 bilhões de anos-luz de distância.
Para além desse horizonte, podemos apenas especular. Pode ser que o Universo seja espacialmente infinito com uma geometria plana (feito o topo de uma mesa, mas em três dimensões) ou aberta (feito o topo de uma sela de cavalo, mas em três dimensões, difícil de visualizar).
O Universo também pode ser fechado, feito a superfície de um balão (mas em três dimensões), ou ter uma forma ainda mais estranha.
A existência do horizonte sugere uma limitação séria: somos parcialmente cegos no que tange à estrutura cósmica. Além do horizonte pode até haver um multiverso. Mas nos certificar disso parece, ao menos por ora, muito difícil, se não impossível.