Texto de HÉLIO SCHWARTSMAN na Folha de SP de hoje.
Num ponto eu e a CNBB estamos de acordo: há coisas mais essenciais com as quais se preocupar do que o dito "Deus seja louvado" nas cédulas de real. Ainda assim, vejo com simpatia o pedido do Ministério Público para que a expressão seja retirada das notas.
Sou ateu, mas convivo bem com diferenças. Se a religião torna um sujeito feliz, minha recomendação para ele é que se entregue de corpo e alma. O mesmo vale para quem curte esportes, meditação e literatura. Cada qual deve procurar aquilo que o satisfaz, seja no plano físico ou espiritual. Desde que a busca não cause mal a terceiros, tudo é permitido.
Isso dito, esclareço que não acompanho inteiramente a tese do procurador Jefferson Aparecido Dias de que o "Deus seja louvado" constrange os que cultuam outras divindades ou não creem. Em teoria, isso pode ocorrer, mas, convenhamos, não é um aborrecimento tão grave que coloque em risco a liberdade religiosa ou estorve a vida em sociedade.
Vou além. Embora o laicismo preconize uma separação radical entre Estado e Igreja, na prática, é impossível desligar inteiramente o poder público de elementos religiosos. Não me incomoda, por exemplo, que o governo paulista mantenha o Museu de Arte Sacra ou que financie uma orquestra que executa peças religiosas.
Penso que o "Deus seja louvado" deveria ser retirado por uma razão mais prosaica: cédulas, bem como as paredes de tribunais, não são um lugar adequado para manifestar a adesão a crenças religiosas. Ainda que a maioria da população professe alguma forma de cristianismo, não marcamos o nome de Deus em todos os bens públicos, como se vê pelas placas de trânsito, viaturas policiais etc. E as notas estão mais próximas dessa categoria do que dos museus.
O que me surpreende nessa história é o fato de religiosos não serem os primeiros a protestar pela inclusão do nome de Deus em algo tão profano e mal-afamado como o dinheiro.
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